Tinha acabado a Missa do Galo. Terminara já a Ceia do Natal. Os membros da família, a pouco e pouco, tinham-se retirado para as suas casas. Nós, os da "casa", arrumada minimamente a sala, recolhidos os presentes que tinham cabido a cada um, acauteladas as virtualhas para o almoço do dia seguinte, como recomendara a minha avó, íamo-nos recolhendo aos nossos quartos.
Deitei-me e dormi.
Acordei sobressaltada com uma luz intensa que parecia vir do presépio pequenino que estava em cima da mesa do canto.
Levantei-me num pulo, impressionada com aquela luz e aquele Menino que parecia saltar da mesa.
Fui à janela e sosseguei. A luz não era senão a do candeeiro da rua cuja luminosidade entrava pelas cortinas abertas.
Tudo normal... Tudo natural...
Mas o sorriso do Menino, esse ... estava lá. E estava lá também o Seu olhar, tão intenso que parecia fitar-me. E aquela voz, dentro do meu peito, igual à que um dia fora dirigida ao" jovem rico " : Queres?...
Sentei-me no chão a pensar. É Natal. Natal mais uma vez. Natal que se repete ao longo de mais de dois mil anos. Natal!... Sempre igual e sempre novo.
E o Menino que continuava a olhar-me e a perguntar : Queres?...
E eu quero, mas o quê?
Continuo a olhar o Menino do meu presépio pequenino e compreendo que o que Ele quer é que O amemos e nos amemos uns aos outros, fazendo de cada coisa pequenina, o nosso Sim como Maria.
É já manhã e eu mantenho-me a olhar esse Menino que é Deus feito Homem e que sorri, porque espera um mundo diferente, em que o amor vença o ódio e a generosidade a indiferença.
Fico olhando e acabo adormecendo. E sonho com um mundo em que "o lobo e o cordeiro habitam juntos, o menino brinca na toca da serpente e o leão e o boi comem ambos palha".
É isto o Natal: "Um Homem que olha outro Homem e o trata como irmão".
Ir. Maria Teresa de Carvalho Ribeiro, O.P.